Do hiperpresidencialismo ao presidencialismo congressual
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Fachada do Congresso Nacional,em Brasília — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo/12-05-2023
RESUMO
Sem tempo? Ferramenta de IA resume para vocêGERADO EM: 12/02/2025 - 20:13
Transição Política no Brasil: Desafios e Proposta de Semipresidencialismo
O sistema político brasileiro passou de hiperpresidencialismo a presidencialismo congressual,com mudanças significativas nos poderes do Executivo e Legislativo. Emendas Constitucionais limitaram poderes presidenciais,aumentando a influência do Congresso. Essa redistribuição de forças gera desafios de governabilidade. A proposta de semipresidencialismo pode ser uma solução para tornar o Legislativo mais responsável por governar.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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O sistema político brasileiro sofre de uma crise de governabilidade. Parte do problema advém do quadro partidário fragmentado,da falta de presidentes populares nos últimos 15 anos e da polarização ideológica. Mas não é possível ignorar nem minimizar a relevância das mutações havidas na lógica de funcionamento do próprio sistema presidencialista,evidenciando uma redistribuição de forças entre os Poderes Legislativo e Executivo.
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Os primeiros 15 anos de vigência da Constituição de 1988 foram marcados por forte predomínio do Poder Executivo. Embora nos debates constituintes houvesse uma influente corrente parlamentarista,a verdade é que,no fim das contas,o presidencialismo prevaleceu,e sua vitória acabou ratificada em plebiscito poucos anos depois. O presidente da República se impunha ao Congresso com poderes cumulativos: chefe de Estado,chefe de governo e da administração,comandante em chefe das Forças Armadas,além de titular da execução orçamentária e financeira. Em sua versão original,a Carta de 88 ainda dava ao presidente o poder de editar medidas provisórias com força de lei. Podiam tratar de qualquer assunto e eram fartamente reeditadas,ainda quando não apreciadas pelo Parlamento. Isso tudo,somado ao poder de nomeação para cargos comissionados e funções de confiança,conferia ao governo ascendência sobre o Congresso e a condução da própria pauta legislativa. O termo hiperpresidencialismo foi cunhado para expressar essa dinâmica política.
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Mas as coisas mudaram. De Dilma para cá (incluindo Lula hoje),o equilíbrio de forças entre Poderes se alterou — talvez tenha até se invertido. Sucessivas Emendas Constitucionais (86/2015,100/2019 e 105/2019) conferiram caráter impositivo a emendas parlamentares ao Orçamento da União (tanto as individuais como as de bancada),chegando ao ponto de autorizar a transferência direta (emendas Pix) de recursos a estados e municípios. Empenho,liquidação e pagamento dessas emendas deixaram de depender de decisão discricionária do Executivo. Noutra frente,as nomeações para diversos cargos (como diretores de agências reguladoras e empresas estatais) passaram para a área de influência do Legislativo,especialmente do Senado. O poder de editar medidas provisórias foi severamente limitado pela Emenda Constitucional 32/2001. Tornou-se comum sua rejeição expressa e tácita (por não apreciação no prazo) ou até a devolução sumária pelo presidente do Congresso. Por fim,o impeachment deixou de ser um processo por crime de responsabilidade do presidente,para virar uma espécie de voto de desconfiança ao governo,manejado com maior liberdade interpretativa pelos parlamentares.
O problema desse presidencialismo congressual é sua resultante prática: um Legislativo com muito poder e baixa responsabilidade política,diante de um presidente da República com elevada responsabilidade e cada vez menos poder. Sem a chave única do cofre,sem o controle sobre as nomeações e sem poder até para pautar temas do seu interesse,o governo enfrenta dificuldades para governar. Talvez a ideia da PEC do Semipresidencialismo,patrocinada pelo Presidente da Câmara dos Deputados,não seja apenas uma maneira de aumentar ainda mais o poder do Legislativo. Talvez seja a forma de torná-lo também responsável por governar. Ou bem restabelecemos as bases do sistema presidencialista — para cujo funcionamento o Executivo precisa ter a gestão da máquina e das contas —,ou então será o caso de mudar nosso sistema de governo.
*cé professor titular da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)