Israel descarta execução de socorristas palestinos, mas admite 'falhas profissionais' e demite comandante envolvido nos ataques
04-21 IDOPRESS
Socorristas carregam corpos de colegas mortos por tropas israelenses,durante funeral no sul da Faixa de Gaza — Foto: Eyad Baba / AFP
Israel divulgou neste domingo o resultado de uma investigação sobre a morte de 14 socorristas palestinos e um funcionário da ONU em 23 de março na Faixa de Gaza,descartando a tese de "execução". O Exército israelense atribuiu o episódio a "falhas profissionais" e demitiu o subcomandante do Batalhão Golani envolvido nos ataques em Rafah,no sul da Faixa de Gaza.
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Segundo o comunicado,“a investigação revelou uma série de falhas de conduta,desobediência às ordens e a ausência de um relato completo do incidente”. Ainda de acordo com as Forças Armadas de Israel,não foi encontrado nenhum indício que prove a ocorrência de uma "execução" em massa nas imediações de Rafah. E a conclusão final indicou que os soldados em campo agiram "de maneira razoável em relação à situação operacional".
As Forças Armadas tinham oferecido justificativas contraditórias para o motivo de seus soldados terem atirado contra os veículos de emergência e alegaram,sem apresentar provas,que a maioria dos mortos eram integrantes do grupo terrorista palestino Hamas. O incidente provocou uma condenação internacional,sobretudo após a revelação de que os corpos dos socorristas — do Crescente Vermelho Palestino,da Defesa Civil e da ONU — foram enterrados em uma vala comum,juntamente com as ambulâncias e outros veículos esmagados por máquinas do Exército israelense. O Exército,por sua vez,admitiu no relatório deste domingo que “a decisão de esmagar os veículos foi equivocada”.
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Inicialmente,os militares alegaram que os veículos estavam sem sinais luminosos e identificações. No entanto,imagens gravadas por um dos socorristas antes de morrer e divulgadas pela imprensa internacional contradizem essa versão: as ambulâncias seguiam em fila e com as luzes ligadas. Mesmo com a divulgação do vídeo,o Exército de Israel argumentou que “devido à má visibilidade noturna,o subcomandante não reconheceu inicialmente os veículos como ambulâncias” e que apenas após a aproximação foi possível identificá-los como equipes de resgate.
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Relatórios de necrópsia obtidos pelo jornal americano The New York Times indicam que os profissionais foram mortos,principalmente,por disparos na cabeça ou no peito. Segundo os laudos,os 14 homens vestiam uniformes – total ou parcialmente – da Defesa Civil ou do Crescente Vermelho no momento da morte.
Como consequência do episódio,segundo a CNN,o subcomandante do Batalhão Golani foi demitido,e o comandante da 14ª Brigada recebeu uma carta de repreensão.
O Crescente Vermelho Palestino rejeitou as conclusões da investigação,denunciando o relatório como "cheio de mentiras". "É inválido e inaceitável,pois justifica o assassinato e transfere a responsabilidade para um erro pessoal do comando de campo,quando a verdade é bem diferente",disse Nebal Farsakh,porta-voz do Crescente Vermelho,em nota à AFP.
Os ataques
A investigação israelense,liderada pelo major-general Yoav Har-Even,reafirmou que os soldados abriram fogo em três momentos diferentes naquele domingo. O primeiro alvo foi um veículo supostamente identificado como pertencente ao Hamas. Neste,dois palestinos foram mortos e um foi preso. Cerca de uma hora depois,os tiros foram direcionados ao comboio de ambulâncias do Crescente Vermelho e veículos da Defesa Civil,que resultaram na morte de outros 12 socorristas.
Um terceiro ataque a tiros atingiu um veículo da ONU. A investigação concluiu que todos os três episódios resultaram de "erros operacionais" e que o ataque ao carro da ONU "violou os regulamentos". "O exame determinou que o incêndio nos dois primeiros incidentes resultou de um mal-entendido operacional por parte das tropas,que acreditavam estar diante de uma ameaça tangível de forças inimigas”,afirmou o Exército.
Na primeira declaração após o ataque,os militares israelenses afirmaram que os homens estavam “avançando de maneira suspeita” e sem as luzes acesas. Depois voltaram atrás após a divulgação do vídeo,que mostrava claramente os veículos identificados com luzes piscando e parados antes do ataque.
Na versão inicial,Israel alegou que nove dos mortos eram integrantes do Hamas ou da Jihad Islâmica,outro grupo militante. Posteriormente,revisou a alegação e afirmou que seis eram integrantes do Hamas. As organizações palestinas envolvidas negam que houvesse qualquer terrorista nos veículos.
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Um vídeo mostra que,quando os soldados israelenses começaram a atirar,alguns paramédicos haviam saído dos veículos e estavam claramente vestidos com uniformes com faixas refletivas nas costas,braços e pernas,que brilhavam sob as luzes das ambulâncias. Os laudos indicam que 11 dos homens tinham ferimentos por armas de fogo,incluindo seis baleados nas costas e quatro na cabeça.
Diversos corpos estavam mutilados,segundo os relatórios. Um dos homens teve o corpo decepado da pelve para baixo. Todos os corpos estavam parcial ou severamente decompostos,o que,de acordo com laudos e com as fotos,dificultou conclusões adicionais,como se os tiros foram disparados à queima-roupa ou a distância.
(Com AFP e The New York Times)