Como a ciência chegou aos cães e gatos
07-07 HaiPress
Para os geneticistas,cães e gatos são assuntos ricos,dada sua longa e estreita história com os humanos — Foto: M. Scott Brauer / The New York Times
RESUMO
Sem tempo? Ferramenta de IA resume para vocêGERADO EM: 07/07/2024 - 04:30
Genética e comportamento de cães e gatos
Cientistas estudam a genética e comportamento de cães e gatos,buscando entender melhor sua convivência com os humanos e promover sua saúde e bem-estar. A pesquisa revela descobertas surpreendentes sobre a cognição e a socialização desses animais de estimação,mostrando a importância de compreendê-los em seus próprios termos.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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Cada cachorro tem uma data para chamar de sua. O dia 14 de julho de 2004,por exemplo,pertence a uma boxer chamada Tasha. Nessa data,o National Institutes of Health anunciou que a cadela de peito largo e maxilares generosos havia se tornado o primeiro cão a ter seu genoma completo sequenciado.
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— Desde então,tudo meio que explodiu — afirma Elaine Ostrander,especialista em genômica canina,do National Human Genome Research Institute,que fez parte da equipe de pesquisa.
Nos 20 anos seguintes,os geneticistas se apaixonaram profundamente por nossos companheiros caninos,sequenciando milhares de cães,incluindo os de raça pura,vira-latas misteriosos,cães de trabalho altamente treinados,cachorros selvagem e até restos caninos antigos.
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A pesquisa sobre cognição e comportamento canino também decolou.
—Estamos começando a ver pesquisas sobre gatos seguindo essa mesma tendência — relata Monique Udell,que comanda o laboratório de interação humano-animal na Oregon State University,nos EUA.
Há apenas algumas décadas,muitos pesquisadores consideravam pets como assuntos pouco sérios.
— Eu não queria estudar cães — revela Alexandra Horowitz,que desde então se tornou uma pesquisadora proeminente no campo da cognição canina.
Hoje,os animais de companhia estão absolutamente na moda. Cientistas ao redor do mundo estão examinando profundamente os corpos e mentes de gatos e cães,esperando aprender mais sobre como eles se infiltraram em nossas vidas,experimentam o mundo e como mantê-los vivendo por mais tempo. É uma mudança que alguns especialistas dizem ter chegado muito atrasada.
— Temos a responsabilidade de entender profundamente esses animais se vamos viver com eles. Também temos esse grande potencial de aprender muito sobre eles e muito sobre nós mesmos no processo — explica Udell.
Projetos de estimação
Para os geneticistas,dada sua longa e estreita história com os humanos e sua suscetibilidade a muitas das mesmas doenças — desde câncer até diabetes.
Os cães têm sido um alvo especialmente atraente. A intensa seleção humana,principalmente nos últimos séculos,criou uma coleção surpreendentemente diversa de caninos,desde chihuahuas até os dogues alemães,além de centenas de raças reprodutivamente isoladas que muitas vezes sofrem de altas taxas de doenças.
Pip é um participante do Darwin's Dogs,a iniciativa científica comunitária que estuda comportamentos e genética de cães — Foto: Sandy Huffaker / The New York Times
Nos anos 2000,os cientistas identificaram as bases genéticas de uma variedade de características caninas,incluindo pelagens encaracoladas e caudas cortadas. Eles encontraram ainda mutações que poderiam explicar por que boxers brancos eram propensos à surdez. Além disso,descobriram que corgis,basset hounds e dachshunds deviam suas pernas curtas a uma aberração genética em uma família de genes que também regula o desenvolvimento ósseo em humanos.
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— Esses primeiros estudos destacaram tanto o potencial que poderíamos aprender com os cães,mas também que precisaríamos de tamanhos de amostra maiores para fazer isso realmente bem — explica Elinor Karlsson,geneticista da UMass Chan Medical School,também nos EUA.
Dessa maneira,os pesquisadores começaram a criar grandes projetos de ciência cidadã,buscando amostras de DNA e dados de cães nos Estados Unidos.
Os donos de animais aceitaram o desafio. O Golden Retriever Lifetime Study,que começou a recrutar em 2012,tem acompanhando mais de 3 mil cães em um esforço para identificar fatores de risco genéticos e ambientais para o câncer,que é comum na raça. Desde 2019,o Dog Aging Project,um estudo de longo prazo sobre saúde e longevidade,inscreveu quase 50 mil cachorros.
O próprio projeto de Karlsson,Darwin’s Dogs,tem,pelo menos,44 mil cães — cerca de 4 mil tiveram seus genomas sequenciados. Os pesquisadores estão minerando os dados em busca de pistas sobre câncer ósseo,compulsão e outros traços.
Entre as descobertas iniciais: embora muitos traços comportamentais,como sociabilidade e treinabilidade,sejam hereditários,eles são amplamente distribuídos no reino canino e a raça é um preditor ruim da personalidade de um cão.
Recentemente,Karlsson revelou uma expansão muito esperada: Darwin’s Cats.
Motoristas de dados
Esses projetos foram possíveis à medida que o sequenciamento genômico ficou mais rápido e mais acessível. Mas o “entusiasmo tremendo” dos donos de animais foi fundamental,de acordo com Ostrander,que lidera o projeto Dog10K,com esforço para construir um catálogo global da diversidade genética canina.
Hoje,os donos de cães sabem mais sobre genética e estão altamente motivados a participar de pesquisas.
— As pessoas dedicam quantidades extraordinárias de tempo e dinheiro à saúde e cuidados caninos. Nos importamos profundamente que eles vivam a melhor vida possível — comentou a especialista.
Pip foi fotografado em um parque na Califórnia — Foto: Sandy Huffaker/The New York Times
A pesquisa também promete informar a medicina humana. Cães e gatos compartilham muitos de nossos genes,claro,mas também compartilham nossos lares.
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— Eles não são um rato vivendo em uma gaiola — ressalta Kelly Diehl,veterinária que dirige as comunicações científicas da Morris Animal Foundation,que está conduzindo o estudo do golden retriever.
Isso torna os animais de estimação bons modelos para estudar influências ambientais e de estilo de vida na saúde. Uma equipe de pesquisadores de golden retrievers,está procurando ligações entre poluentes e linfoma. Os resultados iniciais do Dog Aging Project,portanto,sugerem que cães com estilos de vida ativos têm menor risco de “demência canina” e que viver em um ambiente social,como uma casa com outros animais de estimação,pode ser bom para a saúde canina.
— A grande pergunta é: quais são os fatores biológicos,ambientais e de estilo de vida que influenciam o envelhecimento saudável em cães? Essa é uma questão fundamental para as pessoas também — pondera Daniel Promislow,biogerontologista da University of Washington e co-diretor do projeto.
Dias de cão da psicologia
Há várias décadas,os cientistas que buscavam decifrar as mentes animais normalmente estudavam criaturas selvagens e de cérebro grande,como macacos e cetáceos ou roedores e pássaros.
— As pessoas realmente não pensavam nos cães como animais de verdade. Porque eles estavam em nossas casas e são domesticados: ficam tão adulterados que acabam desinteressantes — reflete Horowitz,pesquisadora de cognição canina do Barnard College.
No final dos anos 1990 e início dos anos 2000,duas equipes de pesquisa relataram que os cães eram talentosos em interpretar sinais humanos,seguindo gestos e olhares das pessoas para localizar comida escondida. Nessas tarefas,eles superaram lobos criados por humanos e até,em alguns casos,grandes macacos. Os estudos,então,sugeriram que os cães possuíam formas sofisticadas de cognição social,e os pesquisadores começaram a ficar atentos.
— O vento mudou. A comunidade de cães é uma das maiores na pesquisa de cognição — comenta Adam Miklosi,pesquisador de cognição canina da Eotvos Lorand University,em Budapeste.
Max,que também participa da Darwin's Dogs,é um pastor alemão de 2 anos — Foto: M. Scott Brauer / The New York Times
Desde então,pesquisas adicionaram detalhes e nuances a esses primeiros estudos,destacando tanto as capacidades quanto as limitações da mente canina. Os dados geralmente confirmam que os cães são habilidosos em tarefas sociais e altamente sintonizados com dicas humanas. No entanto,a ciência também sugere que,às vezes,somos muito ansiosos para projetar nossas próprias experiências nos cães. Quando eles exibem o que muitas pessoas descrevem como uma “cara de culpa” — desviando os olhos e se afastando de seus donos — os cães provavelmente estão respondendo a uma bronca,não sentindo arrependimento por uma má ação,segundo Horowitz.
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O campo floresceu,em parte,porque os cachorros eram cooperativos,convenientes e acessíveis. Então,por que viajar para a natureza ou abrigar centenas de animais em um laboratório?
Até recentemente,os cientistas pouco se interessavam pela cognição social dos gatos,que não descendem de animais altamente sociais e eram frequentemente vistos como distantes. Mas pesquisas emergentes sugerem que alguns deles,têm muita acuidade social,incluindo a capacidade de perceber emoções humanas e seguir olhares humanos. Uma questão é como os gatos adquirem essas habilidades.
— Eles entendem as emoções e seguem pistas apenas se forem expostos a humanos desde cedo? Precisam ser criados com irmãos de ninhada? — questiona Jennifer Vonk,psicóloga cognitiva da Oakland University.
Talvez nossa percepção de gatos como independentes (e às vezes intransigentes) seja uma profecia autorrealizável,de acordo com Udell. Ela observou que os gatinhos normalmente não recebem as mesmas oportunidades de socialização e treinamento que os filhotes de cachorro. Essas oportunidades de enriquecimento podem ajudar os gatos a mostrar aos humanos exatamente do que são capazes.
Cães e gatos se tornaram extremamente bem-sucedidos em navegar no mundo humano,mas aprofundar nossos relacionamentos com eles pode exigir entendê-los em seus próprios termos.
— Eles têm seus próprios impulsos,desejos,necessidades e formas de entender o mundo. É um milagre lindo que sua maneira de entender o mundo,especialmente o social,e nossa forma de compreensão possam se fundir nessa parceria realmente muito bonita — destaca Clive Wynne,especialista em comportamento canino da Arizona State University.