Do samba ao piseiro, do rap ao gospel, conheça os segredos para um bom jingle, tradição no país desde Getúlio Vargas
08-27 HaiPress
Conheça os segredos para um bom jingle — Foto: André Mello
RESUMO
Sem tempo? Ferramenta de IA resume para vocêGERADO EM: 27/08/2024 - 03:31
Diversidade de Jingles Eleitorais: do Samba ao Piseiro
Jingles eleitorais variam de samba a piseiro e rap,com candidatos em SP e RJ explorando redes sociais. Proibição de paródias pela Justiça Eleitoral gera mudanças. Relembrando jingles históricos,como "Retrato do Velho" de Vargas e "Ey,ey,Eymael".O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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Com o início das agendas oficiais nas ruas,os candidatos à prefeitura no Rio de Janeiro e em São Paulo exploram as redes sociais para divulgar um elemento tradicional e quase indispensável das campanhas: os jingles. Nesta eleição,os ritmos escolhidos variam entre o tradicional samba,passam pelo piseiro e pelo funk e chegam ao rap.
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Presentes no país desde os tempos de Getúlio Vargas,os jingles estrelam todas as eleições como uma prática de marketing político. São peça central na internet,convenções partidárias,em carros de som e no corpo a corpo nas ruas,explica a cientista social Juliana Fratini,doutora e pesquisadora pela PUC-SP:
— Eles funcionam como um “louvor bem-humorado” ao candidato,que cria uma conexão com o eleitor e desperta emoções de fácil absorção. Isso porque eles não têm estruturas complexas de comunicação,tanto verbal quanto instrumental,e podem ser usados em momentos diversos.
Para o marqueteiro político Jefferson Rodrigues,da agência Ethos,o lançamento dessas músicas pode acontecer em dois momentos distintos: no meio de uma campanha extensa,funcionando como um “respiro” entre ações de marketing consideradas mais agressivas,ou no fim,atuando como uma “cartada final”.
Ingredientes do jingle
Há mais de 20 anos nesse mercado,o diretor comercial da RDS Studio,Sergio Fontinelly,revela que a criação de um hit eleitoral começa por um briefing completo sobre a personalidade do candidato e das propostas que ele quer lançar. Antes proibidas durante a pré-campanha,expressões que buscam persuadir o eleitor,como “vote” e “apoie”,são então distribuídas pela letra que sintetiza a mensagem final. Por fim,são escolhidos melodia e ritmo.
A escolha certeira do gênero musical depende,de acordo com Jefferson,do gosto pessoal do candidato e do eleitorado que ele pretende alcançar. Em um campo de decisão onde os regionalismos certamente importam,o estilo de cada um também faz a diferença.
Em São Paulo,maior colégio eleitoral do país,as canções escolhidas miram em sonoridades reconhecidas pelo gosto paulistano. O samba foi o preferido pelo candidato à reeleição Ricardo Nunes (MDB),com o refrão “deixa Ricardo lá,deixa o cara trabalhar para cuidar da nossa gente”,e pelo deputado federal Guilherme Boulos (PSOL),que escolheu uma adaptação da música “Tá escrito”,um sucesso nacional.
Tabata Amaral (PSB) aposta numa sonoridade mistura o samba e o rap,com trechos como “veio da Vila Missionária com uma missão,mudar a periferia através da educação”.
Datena (PSDB),por sua vez,tem seu jingle no ritmo do sertanejo universitário — vertente que explodiu no Brasil em meados de 2010. A gravação diz: “Datena,independência e coragem,para livrar São Paulo do crime e proteger nossa cidade”.
Apesar de investir na construção da sua campanha nas redes sociais há meses,Pablo Marçal ainda não tem um jingle oficial. O ex-coach compartilha trechos de músicas criadas por fãs,que usam os ritmos funk e piseiro para projetarem apoio a sua candidatura e repetirem o lema “Faz o M”.
No Rio de Janeiro,o candidato à reeleição Eduardo Paes (PSD) optou por um um samba que destaca seus feitos como prefeito em gestões anteriores,com o refrão “o cara é responsa,o povo aprovou”. Alexandre Ramagem (PL) tem uma canção em que alfineta os concorrentes ao pontuar que os políticos são sempre os mesmos e “os problemas continuam”.
Paródia só com permissão
O deputado federal Tarcísio Motta (PSOL) aposta na comunicação com o público jovem e de forma simplificada,falando em “um Rio sem caô” no seu jingle. Marcelo Queiroz (PP) tem dois jingles com os ritmos de funk melody e pop,ressaltando o compromisso com a causa animal e a distância da polarização.
Entre candidatos a prefeito de municípios menores e vereadores há mais diversidade,com músicas que viralizaram nas redes sociais e hits de ritmos como axé,piseiro,funk,samba e até hinos gospéis. Canções como “Casca de Bala”,do cantor Thullio Milionário,e “Macetando”,de Ivete Sangalo,têm sido as preferidas por essas campanhas,dizem os produtores.
No entanto,o uso de paródias para fins eleitorais foi proibido pela Justiça Eleitoral neste ano. Uma determinação do Tribunal Superior Eleitoral garantiu que autores de obras artísticas usadas sem permissão em peças de propaganda eleitoral podem solicitar que a divulgação do material seja interrompida.
A diretora da Comissão de Direitos Autorais da Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro (OAB-RJ),Paula Heleno Vergueiro,afirmou que a resolução atende uma demanda de artistas apresentada há anos.
Jingles que mudaram a história
Uma das canções mais tradicionais da política brasileira,o famoso "Retrato do Velho",lançado nas eleições de 1950,marcou o retorno de Getúlio Vargas ao poder depois do governo de Gaspar Dutra. Escrita por Haroldo Lobo e interpretada por Francisco Alves,o jingle virou marchinha de Carnaval ao fazer alusão ao primeiro governo Vargas,dizendo: “Bota o retrato do velho outra vez,bota no mesmo lugar”. Na época,as repartições públicas tinham uma foto do presidente pendurada na parede.
Já o famoso "Ey,Eymael" (1985),de autoria de José Raimundo de Castro e Ary Barroso,foi produzido a contragosto do candidato que representava. Em depoimento à revista Época,em 2018,os compositores revelaram que inicialmente Eymael não queria que o seu nome fosse usado oficialmente na campanha,por ser incomum.
Em outra campanha histórica,foram repetidos pelo país os seguintes versos: "Chegou aquele que a gente queria/ Para o Brasil governar/ Agora o povo está contente/ Já temos em quem votar". A música tradicional do Programa Silvio Santos,clássico de todo domingo à tarde,era também um jingle de campanha. A versão para o pleito presidencial de 1989 dizia “Silvio Santos já chegou”,ao invés de “Silvio Santos vem aí”.
Silvio Santos na campanha à Presidência de 1989: seu nome não aparecia na cédula de votação — Foto: Foto: Reprodução/Youtube
O apresentador,que morreu no último dia 17,chegou a fazer gravações explicando que,nas cédulas,os eleitores deveriam marcar o nome do candidato que estava substituindo,Armando Corrêa,até que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impugnou sua candidatura.